PM soube do risco de invasão a Guarapuava dez dias antes do ataque, dizem policiais em depoimentos

Declarações foram feitas durante oitivas de inquérito que apura denúncias de insubordinação. PM não comentou denúncias, mas disse que, em outro inquérito, 'provas e depoimentos estão sendo colhidos para melhor elucidar o ocorrido'

Foto: Eduardo Andrade/RPC

Policiais do 16º Batalhão de Polícia Militar (BPM) de Guarapuava, na região central do Paraná, disseram em oitivas que o setor de inteligência da corporação recebeu informações sobre o risco de invasão ao município pelo menos 10 dias antes da tentativa de mega-assalto registrada em abril.

As declarações foram obtidas com exclusividade pelo g1. Os policiais ouvidos foram indiciados por desacato e desrespeito a superiores em Inquérito Policial Militar (IPM) que apura mensagens sobre a invasão, trocadas em um grupo de WhatsApp, e que foram avaliadas como desrespeitosas.

Entenda:

Nos depoimentos, pelo menos dois policiais detalham ter avisado o setor de inteligência da PM sobre as chances de invasão à cidade. As informações sobre um possível ataque à Guarapuava, afirmam os policiais, foi obtida por meio de um informante.

À reportagem, a PM não falou especificamente sobre as denúncias dos policiais, mas disse que há um outro inquérito para apurar a tentativa de assalto a transportadora de valores de Guarapuava está em andamento. E que, por isso, não pode dar mais detalhes das investigações.

A Secretaria de Estado de Segurança Pública não se manifestou.

Nas oitivas, os policiais disseram ter conseguido informações prévias sobre o uso de armas de longo calibre pelos assaltantes, bem como uso de carros blindados. Segundo eles, tais informações também foram repassadas à PM.

Segundo os depoimentos, os policiais só não tinham certeza sobre quando seria o assalto.

Os policiais também disseram que, a pedido da inteligência da PM, foi solicitado sigilo sobre às informações envolvendo a possibilidade de invasão, que se concretizou no final da noite de 17 de abril.

Inicialmente, os PMs achavam que o assalto poderia ser em Pinhão ou na Colônia Vitória, em Entre Rios, distrito de Guarapuava.

“Semanas antes desse ataque acabamos informando, passando para a P2 [...] As informações foram evoluindo e chegou ao ponto em que ele disse que eles [assaltantes] só estavam esperando o dia do malote do Ceret [Centros Regionais de Distribuição de Dinheiro], aí a gente já imaginou que não seria simplesmente um roubo a caixa eletrônico [...] Quando ele falou a palavra Ceret, a gente imaginou que seria um roubo de bem maior vulto”, diz trecho de depoimento, em menção centros de distribuição utilizados pelo Banco do Brasil (BB).

Em outro trecho, um policial confirma que, após o repasse das informações aos superiores, foram realizadas reuniões. Porém, nenhum plano de contingência foi apresentado ao efetivo do batalhão.

“A gente teve algumas reuniões com esse pessoal, sargentos e capitão, até uma vídeo chamada que durou mais de uma hora [...] repassando todas as informações, de que seria um ataque aí ou com tomada de cidade, ou novo cangaço [...] seria em torno 5 ou 6 carros blindados, mais de 20 indivíduos armados, de arma longa, fuzis, e metralhadoras, e a gente passou todas as informações aí às pessoas competentes [...] A única coisa que eles pediram foi pra não passar pra tropa, pra não frustrar o trabalho deles, não estragar o serviço de inteligência que eles fariam ou iriam fazer, a gente não sabe”.

Pouco após a invasão, o Comando Geral da PM foi contestado sobre a existência de um planto de contingência, mas sustentou que o plano existia e que foi executado.

Policiais frustrados
Durante os depoimentos, os policiais sinalizaram que estavam frustrados após terem reportado a invasão, e não terem recebido a atenção que consideravam necessária.

“Penso que se levassem a sério as nossas informações, eu penso que poderia... Não digo ter frustrado, mas teria minimizado o acontecido. E eu acredito que você tomar as dores de um companheiro de farda e ate se ‘emotivar’ pela amizade, não seria justo, vamos dizer, ser punido por um desabafo”, afirma um dos policiais ouvidos.

O advogado de defesa de parte dos policiais, Zilmo Girotto, disse que frente às denúncias, vai pedir uma investigação do Ministério Público do Paraná (MP-PR) e também a Corregedoria da PM.

Contestações no inquérito
Ao todo, 32 policiais foram indiciados. O g1 teve acesso a mais de 20 depoimentos deles.

Nas oitivas, eles são contestados sobre as mensagens que enviaram, em 23 de abril, em um grupo chamado '1ª Companhia Independente'.

Entre outros pontos, a defesa dos indiciados sustenta que os policiais enviaram as mensagens em um grupo não oficial, criado de maneira independente por um soldado.

Documento que gerou o inquérito policial militar diz que as mensagens, classificadas como desrespeitosas, foram enviadas em um grupo oficial de trabalho.

Todas as declarações que motivaram o inquérito foram feitas após a confirmação da morte cerebral do cabo Ricieri Chagas. O policial participou do combate ao assalto, e foi baleado na cabeça pelos criminosos.

Nas oitivas, enquanto se defendiam, grande parte de dos policiais disse que as declarações pelas quais são investigados foram feitas em momento de forte emoção, após a morte de Chagas.

Muitos dos indiciados lembraram que, no dia do assalto estavam de folga, e que foram às ruas para participar da operação após saberem, por meios informais, da tentativa de assalto à cidade.

O discurso unânime foi de que, antes e no dia dos ataques, os policiais não receberam orientações sobre como proceder em caso de invasão da cidade.

“Primeiro eu fiquei sabendo por um civil, que entrou em contato comigo, perguntando o que tava acontecendo. Nem eu sabia [...] Não fui acionado por grupo nenhum [...] Não tive conhecimento, não fui avisado, não fui orientado sobre esses fatos em nenhum momento [...] Se existia esse plano [de contingência], eu não tinha conhecimento, não tive acesso”.

No início de julho, a PM informou que, após a conclusão do inquérito que apura os possíveis crimes militares, o Ministério Público decidirá se oferece denúncia. Caso haja denúncia, ela seja aceita pela Justiça, e haja eventual condenação, a pena máxima é a expulsão das fileiras da corporação. (Com Portal G1).


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